quinta-feira, 4 de março de 2021

Escombros

 O riso postado no rosto suado

Corta cotidiano o silêncio lúgubre

Da atmosfera de sonhos encerrados

Nas risonhas catacumbas insalubres


A máquina ginga com a morte dia a dia

Triste, alegre e forte, esta quimera

Perdida da Nau do Descobrimento, harpia

Que na infinita caça de si mesma se esmera


Sabendo ser pouco o tempo que lhe resta

Entre celebrar a vida e a Última Festa

Explode feito cometa fora de órbita

Lá, onde o Infinito acolhe a Incógnita


E no batuque timbrado de relevos ancestrais

Inscreve na fronteira entre Cultura e Barbárie,

Sob o signo do Naufrágio de tudo que as separe,

A fundação do Amanhã dos escombros do cais


Eduardo Maskell

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Inferno Morno

Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente!

Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca.

Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu;

Aconselho-te que de mim compres ouro provado no fogo, para que te enriqueças; e roupas brancas, para que te vistas, e não apareça a vergonha da tua nudez; e que unjas os teus olhos com colírio, para que vejas.

Eu repreendo e castigo a todos quantos amo; sê pois zeloso, e arrepende-te.


Apocalipse 3:15-19


Na natureza etérea do instante

Entremeado entre o suspiro

E a morte surda e certa, galopante

Na velocidade cega do tiro


Gárgulas famintas devoram o banquete

Do arremedo de vida servido

Por Eros e Tânatos, a operar este aríete

Contra as entranhas da libido


À guerra! Declaram, em violenta virulência

As últimas barreiras do silêncio e do sorriso

E percorrem rotas imunológicas rumo ao paraíso

Cada palavra sepultada entre a fé e a consciência


Como pedras que edificam o significado, corre

Em veias sem destino o álcool deste porre

De realidade. Vida e morte se con-fundem,

São metades, derradeiras, passageiras, brancas nuvens

                                       

Enquanto as gárgulas seguem insaciáveis

Sua sina e sua sede de sangue civilizacional

Nas fronteiras perdidas do sonho nacional

Passado e presente se tornam improváveis


E a fina flor do futuro demora a nascer.

Ou nasce morta, da vontade desse não-ser

Tão humano quanto desumano, tão infértil

Quanto a fachada cinza do mais alto prédio,


Arranha-céu onde habitam os sonhos do mundo

Fazendo girar a roda morta dessa não vontade

De ser, que é o fundo de um poço sem fundo,

E arranha até as brancas nuvens e suas metades


Da mesma moeda, do mesmo copo que serve a água,

O sangue e o corpo de Cristo e dos orixás,

Até que não reste alma imune à etérea praga,

Até que estejam à venda alma, corpo, sangue e ar...


Na natureza eterna do instante,

Diante, sempre, do último suspiro

Na boca da Gárgula, no semblante

Banal do Mal, no abismo, no retiro.


Calam-se as vozes que não cabem na História

No devir que não veio e ficou, no silêncio da Memória

Inerte na praia do Tempo, parada, esta pedra

Da semente do fruto da árvore que não medra.


Títeres do Amanhã puxados

Por um fio de vida mal vivida

De moiras lavadeiras à espera da cura

Capaz de fechar esta eterna chaga, a Grande Ferida

Na carne mais barata, no corpo mais alvejado

Náufragos de si à procura

De mais, do mesmo.

Todos contra todos, peões na partida

Da vida e morte a esmo

No tabuleiro da Loucura.


Eros e Tânatos em eterno retorno

Exú na encruzilhada do Destino

Ferro do machado de Xangô no forno

Karma adiado, gigante acordado, pequenino. 

Brasil. Pátria armada. Inferno morno.


Eduardo Maskell

sexta-feira, 19 de abril de 2013

19/04/2013

Era tarde e sol
Era mais um dia
Passando, passando...
Mais um dia e só.
Dia da Poesia,
Dia a dia, cotidiano.

E o cansaço na pele,
No corpo, na cara,
O tempo que não para,
Ainda que se atropele.

A urgência de tudo,
A extrema necessidade,
O verso por sobrevivência...
Rima pobre em verso mudo.
De viver, nem a vontade;
E o silêncio, a insurgência.

Sob o calor de infernos maquinais
Brota a vida, pobre mortal;
E vivos nós, como algo tão banal,
Carne e osso à espera de mais...

E o saber que não se sabe
Vem do peito
A alma de toda a psicanálise
Que em mim não cabe.
Morte e vida ao leito,
Num grito: calem-se!

Eduardo Ferreira

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

19/11/2012

Silêncio,
Saudade.
Vontade de
?

E partir.

Para um algum lugar direção qualquer que me queira.

Onde querer nada seja ter tudo.


E de longe ver ficar a vida distante.

Nos espaços vazios de sentido.

Nos vazios de espaço.

No sentido vazio.

No vazio,

No vazio,

Partir.

Eduardo Maskell