Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente!
Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca.
Como dizes: Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta; e não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu;
Aconselho-te que de mim compres ouro provado no fogo, para que te enriqueças; e roupas brancas, para que te vistas, e não apareça a vergonha da tua nudez; e que unjas os teus olhos com colírio, para que vejas.
Eu repreendo e castigo a todos quantos amo; sê pois zeloso, e arrepende-te.
Apocalipse 3:15-19
Na natureza etérea do instante
Entremeado entre o suspiro
E a morte surda e certa, galopante
Na velocidade cega do tiro
Gárgulas famintas devoram o banquete
Do arremedo de vida servido
Por Eros e Tânatos, a operar este aríete
Contra as entranhas da libido
À guerra! Declaram, em violenta virulência
As últimas barreiras do silêncio e do sorriso
E percorrem rotas imunológicas rumo ao paraíso
Cada palavra sepultada entre a fé e a consciência
Como pedras que edificam o significado, corre
Em veias sem destino o álcool deste porre
De realidade. Vida e morte se con-fundem,
São metades, derradeiras, passageiras, brancas nuvens
Enquanto as gárgulas seguem insaciáveis
Sua sina e sua sede de sangue civilizacional
Nas fronteiras perdidas do sonho nacional
Passado e presente se tornam improváveis
E a fina flor do futuro demora a nascer.
Ou nasce morta, da vontade desse não-ser
Tão humano quanto desumano, tão infértil
Quanto a fachada cinza do mais alto prédio,
Arranha-céu onde habitam os sonhos do mundo
Fazendo girar a roda morta dessa não vontade
De ser, que é o fundo de um poço sem fundo,
E arranha até as brancas nuvens e suas metades
Da mesma moeda, do mesmo copo que serve a água,
O sangue e o corpo de Cristo e dos orixás,
Até que não reste alma imune à etérea praga,
Até que estejam à venda alma, corpo, sangue e ar...
Na natureza eterna do instante,
Diante, sempre, do último suspiro
Na boca da Gárgula, no semblante
Banal do Mal, no abismo, no retiro.
Calam-se as vozes que não cabem na História
No devir que não veio e ficou, no silêncio da Memória
Inerte na praia do Tempo, parada, esta pedra
Da semente do fruto da árvore que não medra.
Títeres do Amanhã puxados
Por um fio de vida mal vivida
De moiras lavadeiras à espera da cura
Capaz de fechar esta eterna chaga, a Grande Ferida
Na carne mais barata, no corpo mais alvejado
Náufragos de si à procura
De mais, do mesmo.
Todos contra todos, peões na partida
Da vida e morte a esmo
No tabuleiro da Loucura.
Eros e Tânatos em eterno retorno
Exú na encruzilhada do Destino
Ferro do machado de Xangô no forno
Karma adiado, gigante acordado, pequenino.
Brasil. Pátria armada. Inferno morno.
Eduardo Maskell